Há algum consenso entre os especialistas dos motivos de um dólar tão alto. São quatro: instabilidade política dentro do país, queda da taxa básica de juros, incerteza sobre a duração da pandemia do novo coronavírus e a situação fiscal do país depois que a economia tomar ares de normalidade.
O único sinalizador positivo, por ora, é a lenta retomada da economia de países que parecem ter passado pelo pior da emergência sanitária da Covid-19. O maior exemplo é a China. O Brasil, por sua vez, não tem um cenário animador.
“Quando fazemos modelos econométricos, chegamos à conclusão de que o real está muito desvalorizado frente ao dólar, e poderia ir para uma faixa abaixo de R$ 5. Mas como vai acontecer em um ambiente como o que temos?”, diz o economista Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central e sócio da Tendências Consultoria.
“Com os gastos para a contenção da pandemia e queda da arrecadação, teremos um grande déficit fiscal e agravamento do endividamento”, diz. “Quando a situação se resolver, resta uma grande dúvida da capacidade política de o governo se articular com o Congresso para medidas de controle de despesas.”
Medições como a do Instituto Fiscal Independente (IFI) mostram que a dívida pública do país deve chegar a 84,9% do PIB só com as medidas de contenção contra a doença. O déficit previsto pelo secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, passa de R$ 700 bilhões e as cifras podem aumentar caso o Brasil não consiga aplacar a pandemia.
“Os ruídos contra a estabilidade geram influência negativa, como atritos institucionais do Executivo com Judiciário, os sinais ao comércio exterior, o processo movido por Sergio Moro, a saída de Luiz Henrique Mandetta e outros passos em falso, como o programa Pró-Brasil sinalizam incertezas, inclusive de que a posição do ministro Paulo Guedes pode não ser tão sólida”, diz Loyola.
Para o pesquisador da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/IBRE), Livio Ribeiro, “parece haver espaço para algum enfraquecimento adicional [do real frente ao dólar]” por conta do cenário doméstico.
“Questões domésticas brasileiras que vão além da pandemia fazem com que o país entre em um cenário de maior incerteza para os investidores”, apontou.
O economista destacou que com os juros baixos [a Selic opera em patamar mínimo histórico] o país não é atrativo para o capital especulativo e também oferece um cenário propenso a investimentos no longo prazo.
“Já tem algum tempo na economia brasileira temos tido crescimento anêmico, além de muita instabilidade institucional e uma incerteza muito grande para os investidores”, explicou Ribeiro. “A única forma do país se tornar atrativo é se tornar mais barato, o que acontece com uma moeda mais fraca.”
O professor Haroldo Monteiro, coordenador do MBA de Finanças da Universidade Veiga de Almeida, avalia a possibilidade de o dólar chegar a R$ 6,70, acima do que é apontado por bancos internacionais, que sugerem um teto de R$ 6,50.
“Não me surpreende se esse dólar subir mais uns 10%, 15%, chegando a uns R$ 6,70”, apontou.
“A pandemia fez com que o governo abrisse a torneira dos gastos públicos para dar um suporte nessa economia, o que faz com que os agentes tenham medo de que no futuro, após o término desse suporte financeiros às empresas e às pessoas, isso afete muito a dívida pública, o que também faz com que os agentes [investidores externos] tirem dinheiro do país”, destacou o professor.
“Se a gente tivesse a queda de juros, mas estabilidade política, a gente não teria tanta desvalorização da nossa moeda”, acrescentou Monteiro.